domingo, 28 de junho de 2009

A Mosca

O Presidente Obama matou uma mosca. Uma mosca! Numa entrevista.
A mosca andava ali de roda, enquanto ele ia satisfazendo a curiosidade do jornalista acerca das questões americanas e mundiais que o ocupam. E o Presidente não esteve com meias medidas. Matou-a. E o mundo pasmou, porque o senhor Presidente dos Estados Unidos matou uma mosca em público. “O Presidente Obama quebrou hoje mais uma barreira”, introduziu o jornalista que teve o gosto de apresentar à Nação Lusa este episódio.
Estou convencido que aquilo é a inspiração advinda do convívio com Bo, ilustríssimo cão-de-água presidencial. Não que Obama precise de se inspirar no seu companheiro de quatro patas. Mas o convívio com aquele exemplar, não português, mas de ascendência portuguesa, que há-de ainda colher alguma da garra e do desembaraço com que nós por cá lidamos com moscas, certamente não foi inócuo. Claro que a garra é nossa. E o desembaraço. Não dos cães. Não quero que alguém pense que desmereço o sangue luso que me vai nas veias. Mas que diabo, se o cão era nosso, quer dizer, neto de um nosso, então há-de ter aprendido alguma coisa… E a um presidente com a estatura e a coragem de Obama só pode convir um cão à altura.
O mundo pasma-se com a desenvoltura de Obama. Faz acreditar de novo que nem tudo está perdido. Mas parece-me que começamos a cair no ridículo com a parafernália de notícias à roda do Presidente…
Que me importa a mim, ou ao mundo, que o Presidente mate moscas?... Talvez ainda se arrisque a uma manifestação aos portões da Casa Branca… Nós por cá gostamos tanto de manifestações e barafustar por tudo e por nada… Pergunto-me se por lá também será assim. Se perdem tempo e energia (todo o tempo) a discutir e a manifestar-se e a reclamar e a trocar galhardetes sobre culpas (políticos e não políticos. Parece ser uma espécie de característica nacional)… Se por lá também discutem, discutem, discutem e depois ficam todos contentes e inchados a dar grandes entrevistas sobre como deram bordoada no governo. E depois, toca a ir para casa, no carrito topo de gama, a fazer contas ao ordenadinho chorudo que o país lhes paga para não fazer nada e só discutir, discutir, discutir.
Há tanta mosca por cá… Custa-me é a ver a garra. E o desembaraço. A não ser que haja um qualquer envolvimento pessoal, que toque na carteira ou no interesse… Aí, somos como leões lançados a cordeiros.
As eleições europeias já foram à quase um mês. Confesso que não dei atenção à campanha eleitoral, a não ser àqueles episódios caricatos que toda a gente viu. Nem eu, nem ninguém. Senão a abstenção não teria sido tão alta…
Mas não entendo. Não gosto de política. Tudo aquilo cheira a azedo, a terrivelmente desadequado, a panelinha, a jogo de comadres… Tudo aquilo me tira a paciência. Mas, ainda assim, é o que temos. Não entendo a atitude de querer ficar quieto. De fora. Como se não fosse nada connosco. E quanto mais se ignora, mais se alimenta o status quo… E assim vamos alimentando as moscas.
É engraçado ver a azáfama dos partidos a colocar cartazes e a distribuir panfletos. É giro vê-los a dizer sempre as mesmas coisas, embrulhadas em “ideias” novas. “Queremos mais! Mais votos, mais lugares, mais deputados, mais filiados, mais povo português do nosso lado”. Mais votos quer dizer mais subsídios para o partido… Quando pensamos na lógica da coisa, não é difícil perceber onde está o verdadeiro interesse. E “onde está o teu tesouro, aí está o teu coração”… Tantas moscas…
Apesar de já ter passado quase um mês, as ruas, pelo país fora, continuam cheias de cartazes de propaganda. Gostava de ver a azáfama dos partidos a retirar os cartazes, com o mesmo empenho e brio com k andaram ai a espalhá-los… “Ah, não, isso já não é da nossa responsabilidade”… E será que ainda se lembram do programa eleitoral? Das ideias pelas quais se vão bater em Bruxelas?...
“Bem, o governo…” Mas qual governo? Eu perguntei das europeias, não do governo… “Ah… as europeias”…
Pois, ninguém sabe. Eu fui votar. Mas também não sei. Foi um descargo de consciência cívica. Esperemos que os ilustres deputados saibam, já que nós por cá, ficamos completamente às escuras. Ou teremos que chamar o Presidente para matar as moscas?
Garra, senhores. Garra. E desembaraço.